Realidade e idealização
Era nos idos de 70.Eu, meu marido, minha mãe e as crianças morávamos no
Paraná.A algumas milhas da civilização.
Ele trabalhava em reparo e recapeamento de estradas.Na maioria das
vezes, eram semanas só eu, as crianças e minha mãe.
Acontecia muito de pessoas estranhas entrarem no seu quintal, colher da
sua horta e pegar galinhas do seu galinheiro.Principalmente, quando se sabia
haver só mulheres e crianças.Isso, sem falar que passavam pelo seu varal e
levavam as roupas.
Irritada com isso, pedi a um vizinho uma espingarda, para espantar os
javalis e lagartos do quintal.E ele emprestou uma arma novinha, de última
geração.
Não demorou muito a aparecer os invasores por lá.Eu havia ido ao mercado
e quanto voltei, um alarido no pátio.Eram umas cinco pessoas, assando duas das
minhas galinhas e preparando uma bela salada de alface.Perguntei:
-Eu conheço vocês?
-Não, porque?
-Quem deu licença para fazer churrasco no meu pátio, colher das minhas
alfaces e roubar minhas galinhas?
-Tá reclamando do que, dona?Não
vai te deixar mais pobre!
-Não é isso!É a falta de respeito com a propriedade alheia!
-Ah, vai te catar!
Fui. Saí dalí e voltei com a
espingarda.Furei a chaleira com um tiro e recheei as galinhas de “azeitonas”.
-Bom, as galinhas já estão
assadas!Sumam daqui!
-Mas, a gente nem comeu ainda!
-Peguem os espetos e caiam
fora!
Eles pegara os espetos quentes e
saíram praguejando.Um fez menção de voltar mas, atirei perto dos seus pés.Ele
sumiu no meio do mato.Depois, vi que haviam deixado a cuia de chimarrão.
Daí há pouco, o vizinho apareceu
na sua pick-up, preocupado:
-Tudo bem aí, Donna?
-Tudo!
-Ouvi uns tiros!
-Não foi nada, não!Só um javali
mexendo na minha horta!
E hoje eu fico pensando: que
temeridade!Você ficar só com a família no sertão à mercê de bandidos!Muitos
quando souberam, me condenaram por ter brigado por comida.Não era apenas isso.Hoje,
invadem o meu pátio para roubar comida.Amanhã invadem o meu sítio e me expulsam
de casa, como sucedeu com minha bisa.
Por essa e por outras razões, sou
contra o desarmamento.Abençoada espingarda que me livrou desse incômodo!
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